Sem dúvida, é postura democrática atender as reivindicações populares. Mas há uma ressalva: nem sempre a voz das ruas é a melhor conselheira, principalmente quando as manifestações abrigam grupos reunidos sob a vaga bandeira de “protestos contra o que está aí”. Recentes pronunciamentos da presidente Dilma Rousseff parecem ter sido pautados por uma avaliação mais ponderada das respostas a serem dadas aos anseios de crescentes segmentos da população. Por exemplo, ao abrir a 41ª reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), a presidente declarou ser dever do governo traduzir as demandas em ações práticas e, para isso, apresentou a proposta de cinco novos pactos: estabilidade fiscal, mobilidade urbana, educação, saúde e reforma política.
Tais pactos têm foco em persistentes questões que há décadas esperam solução do governo, tanto para reduzir as graves desigualdades sociais quanto para desatravancar os rumos do desenvolvimento econômico. Houve, é verdade, avanços nesses campos, mas que estão se revelando insuficientes para atender às aspirações intensificadas com a recente ascensão das classes C, D e E.
Uma das motivações do aumento da pressão sobre as administrações públicas reside na natureza humana: as pessoas querem mais quanto mais têm. Outra se encontra na omissão de sucessivos governos, que não concederam a devida prioridade às políticas públicas voltadas à solução ou, pelo menos, redução dos graves problemas agora privilegiados pelo governo federal. Ainda há muito a fazer, a começar pelo melhor uso do dinheiro público, a partir do respeito ao salutar princípio enfatizado pela presidente na reunião do CDES: o governo só pode gastar os recursos de que dispõe, para não comprometer o equilíbrio fiscal e o controle da inflação.
Além de sinalizar os reais anseios da sociedade (nem sempre notados em ambientes rarefeitos do poder), a voz das ruas vale por um alerta aos governos de todas as esferas: chegou o tempo de olhar não só para o passado ou para o presente. É preciso mirar o futuro, antecipar soluções para demandas que virão e planejar adequadamente as medidas adotadas para responder aos clamores, de forma a não gerar novos problemas. Até porque aqueles que ficarem atentos poderão perceber os rumores de insatisfação antes que se transformem em gritos das ruas.
*Ruy Martins Altenfelder Silva é membro do CDES e presidente do CIEE e da Academia Paulista de Letras Jurídicas (APLJ).