No final do ano passado, a Secretaria Estadual de Cultura rompeu a parceria com o Instituto de Museus, Memórias e Identidades (IMMI), que desde 2005 gerenciava o Memorial do Imigrante, na Mooca. O espaço, criado na antiga hospedaria que recebeu os primeiros imigrantes do estado paulista, é tombado e abriga importante acervo histórico deste processo imigratório. Agora, o Memorial será gerido pelo Instituto da Arte do Futebol Brasileiro, o mesmo que responde pelo Museu do Futebol, da Prefeitura. Tal decisão pegou de surpresa os membros das 70 etnias que participavam da execução dos trabalhos no Memorial. A preocupação deles é com o destino do acervo e também com a continuidade de atividades tradicionais, como a Festa dos Imigrantes que chegava a reunir cerca de 20 mil pessoas por edição.
Segundo o vice-presidente do Grupo Volga de Folclore Russo, que também preside a Associação dos Moradores de Vila Zelina (Amoviza), Victor Gers, o anúncio do fim da parceria entre o IMMI e o Estado foi repentino e num período proposital. “Em reuniões com a Secretaria de Cultura sempre foi prometida a renovação do contrato. Mas, no final do ano, eles comunicaram sobre o encerramento. Fomos pego de surpresa e numa época em que fica complicado se mobilizar”, comenta Gers, que é ligado ao IMMI.
Ele vê a decisão do Estado como retaliação. “Em setembro, o secretário de Estado da Cultura, Andréa Matarazzo, exigiu a nomeação de quatro conselheiros ligados ao Governo para fazer parte da diretoria do Memorial, mas, pela legislação, havia apenas uma vaga, portanto, as indicações não foram aceitas pelos 11 conselheiros eleitos pelos associados do Instituto. Acreditamos foi esse o motivo da alteração na gestão. Vínhamos desenvolvendo um ótimo trabalho no local”, conta.
Desde o início do ano, as atividades no Memorial foram suspensas e o prédio interditado para restauro. “Com isso, o material histórico, que também é tombado, foi transferido para o Arquivo do Estado de São Paulo. Tememos por esse acervo que é muito precioso e requer cuidados específicos de manuseio e armazenamento”, ressalta Gers. “Para transferência do acervo é necessária autorização do CONDEPHAAT (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico e Turístico do Estado), o que não sabemos se aconteceu”, comenta.
Integrantes do IMMI apontam ainda outros fatores negativos na troca repentina de gestão. “Parte do Memorial costuma ser atingida pelas enchentes e havia todo um trabalho de prevenção, que não está mais em prática. Ficamos sabendo que, após forte chuva dias atrás, materiais foram danificados por terem permanecido no alagamento”. Eles prometem não desistir e estão estudando formar a Associação das Comunidades de Imigrantes, cuja primeira meta será entrar com uma representação no Ministério Público Estadual para questionar o processo de seleção da nova entidade gestora.
“Abriram uma espécie de licitação e a organização social que tivesse interesse de gerir o Memorial teria que, em cinco dias, apresentar os projetos e novas diretrizes para o espaço. Como é possível apresentar isso em cinco dias? Acreditamos que esse processo foi dirigido”, conclui Gers.
Bonde dormitório
Na manhã de ontem, a reportagem da Folha foi conferir a situação do Memorial do Imigrante e flagrou moradores de rua espalhados por toda calçada da fachada da unidade. Até os bancos do histórico bonde que, principalmente aos finais de semana, fazia a alegria de famílias inteiras com os passeios pelas ruas dos arredores, estavam sendo usados como dormitórios.
Secretaria da Cultura se posiciona
Em extenso esclarecimento encaminhado à redação da Folha, a Secretaria de Estado da Cultura informou que o contrato de gestão com o Instituto de Museus, Memórias e Identidades (IMMI) foi encerrado dia 21 de dezembro de 2010. Foi ressaltado que a Secretaria, que é a responsável pelo Memorial do Imigrante e tem a obrigação e a responsabilidade legal de propor as diretrizes e prioridades desse equipamento cultural, “definiu otimizar o escopo das ações no ano de 2011 e concentrar os esforços no desenvolvimento de um novo projeto museológico e museográfico, tendo em vista a necessidade de ampliar a qualificação desse museu e o fato de que, durante esse ano, ele estará fechado para obras de restauro”.
Sobre a mudança de gestão, foi enfatizado que “ninguém por parte do Governo do Estado, em nenhum momento, deu qualquer orientação que não fosse a de que toda e qualquer organização social interessada em gerenciar o Memorial deveria participar do chamamento público publicado no Diário Oficial do Estado”. Para Secretaria, “a decisão de não participar da concorrência é de responsabilidade exclusiva da antiga gestora”.
A Secretaria informou que o Instituto da Arte do Futebol Brasileiro foi a única instituição qualificada como organização social de cultura a apresentar proposta para o Memorial e que a mesma foi considerada adequada. Foi enfatizado que o IMMI não apresentou proposta e portanto, não teve como dar continuidade à parceria.
Obras de restauro
De acordo com a Secretaria, durante a obra que se estenderá por este ano, o acervo documental ficará temporariamente armazenado no Arquivo do Estado de São Paulo, que tem dado continuidade às ações de higienização, reprodução e documentação, bem como a prestação dos serviços cartoriais ao público (emissão de certidões e atestados). O acervo museológico foi armazenado em reserva técnica, onde ficará até o fim do restauro do prédio.
Sobre a remoção de todo esse acervo, a Secretaria informou que por se tratar de situação emergencial, visto que as obras de restauro da edificação já tinham iniciado, foi comunicada ao CONDEPHAAT e ao CONPRESP. “Além disso, o manuseio e a retirada foram realizados por profissionais especializados do Arquivo do Estado, que conduziram toda a embalagem e acompanhamento do transporte do acervo”.
Por fim, a Secretaria ressaltou que, junto com a nova organização social gestora do Memorial, pretende dar continuidade às ações e atividades do museu, como o Festival Anual de Danças Folclóricas.
😥 Todos deveriam visitar o Museu do Imigrante, um lugar muito bonito e transmite toda a idéia dos nossos avós e familiares.