Ao longo do verão, a população não fica preocupada apenas com as fortes tempestades que atingem São Paulo nos finais de tarde. Somente no dia 16 de fevereiro deste ano, a cidade registrou 2.264 descargas elétricas durante a chuva. O número assusta ainda mais quando se considera todo o território nacional. O Brasil é o recordista mundial em raios, com cerca de 50 milhões de incidências anuais.
Os levantamentos feitos pelo Grupo de Eletricidade Atmosférica (Elat) do Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe) apontam outro fator ainda mais temeroso. Anualmente, por volta de 500 pessoas são atingidas por raios no país, sendo que 130 delas acabam falecendo. Neste ano, até o mês passado, foram registradas 46 mortes por descargas elétricas atmosféricas. E o número deve aumentar até o fim do ano, com a chegada das chuvas de verão.
De acordo com o Elat, a grande incidência de raios no Brasil tem explicação: o país é o maior território da chamada zona tropical do planeta – área central onde o clima é mais quente e, portanto, mais favorável à formação de tempestades. Esse fator, aliado ao impacto da urbanização, facilita ainda mais a formação de raios.
A verticalização das cidades e o aumento de descargas elétricas também são situações interligadas, a prova disso é a Grande São Paulo. Dados históricos apontam que a região sofreu um acréscimo de 40% no número de raios nos últimos cem anos, sendo Guarulhos a cidade campeã com 11,67 descargas por km² ao ano e São Paulo tendo 9,29 por km² no mesmo período. Isso se deve também ao aumento de dias com tempestades no país, que foi de 70% ao longo dos últimos 50 anos.
Outro índice que comprova que quanto mais quente e mais urbanizado o local, maior é o número de raios, é que a região Sudeste é a recordista em incidências no país, seguido pelo Sul.
E se engana quem pensa que as descargas elétricas atmosféricas são apenas mais um problema em meio às cheias de verão. Na verdade, elas são o maior perigo durante esta estação do ano. De acordo com o Elat, de 1991 a 2010, 2.640 pessoas morreram no Brasil após serem atingidas por um raio, enquanto 2.475 mortes ocorreram devido às enchentes e deslizamentos. São Paulo é o estado líder do país em número de óbitos registrados na última década, somando 248 falecimentos. Então o aconselhado é que durante a tempestade a pessoa procure se abrigar em locais fechados e evite ficar em campos, perto de fiações, metais e árvores.
Diferença entre relâmpagos e raios
Relâmpagos são as descargas elétricas geradas por nuvens de tempestades. Já os raios são aquelas descargas que, saindo da nuvem, atingem o solo.
MITOS E VERDADES
Mitos
Um raio não cai duas vezes no mesmo lugar. Geralmente os raios caem mais de uma vez em um mesmo local quando este apresenta grande incidência de raios.
O guarda-chuva protege contra raios. Mentira, já que o objeto possui partes metálicas.
Espelhos devem ser cobertos, pois atraem raios. Espelho não é condutor de eletricidade.
É perigoso ficar perto de janelas durante tempestades. Na verdade, se as janelas estiverem fechadas elas irão te proteger.
Bijuterias podem atrair raios. Mentira, os materiais usados em bijuterias não são suficientes conduzir uma descarga elétrica.
Na praia, entrar no mar pode me proteger. Tanto o oceano como a areia são campos abertos e propensos a raios.
Verdades
É perigoso falar ao telefone ou ao celular conectados ao carregador durante uma tempestade. O fio é um condutor de eletricidade.
Ficar dentro do carro com a janela fechada durante uma tempestade é seguro, mas evite encostar-se a partes metálicas do automóvel.
Tomar banho durante uma tempestade é perigoso, já que o raio pode atingir a fiação e conduzir a eletricidade pela água.
Calçados de borracha protegem contra descargas elétricas.
Se duas pessoas estiverem abraçadas ou de mãos dadas e uma for atingida por um raio, a outra também sofrerá a descarga.
É perigoso andar de moto, bicicleta ou trator durante a tempestade. Todo objeto ou veículo que tenha metal é considerado um condutor de eletricidade e os três transportes são abertos, sem área para proteção.
Morador da Vila Prudente já foi atingido em cemitério
Há exatamente 54 anos, 12 pessoas se abrigavam embaixo de uma árvore durante uma tempestade no cemitério Quarta Parada, no Belenzinho, quando um raio atingiu o local. Uma mulher de 20 anos morreu na hora e outras 11 pessoas ficaram feridas. Dentre elas, o morador da Vila Prudente, Mario Vecchio, hoje com 77 anos.
“Eu passei com a minha moto perto do cemitério, era Dia de Finados, e meu pai tinha o costume de visitar o túmulo da família na data. Resolvi entrar para procurá-lo e a chuva apertou, começaram os raios. Vi um grupo se abrigando na árvore e me juntei a eles. De repente deu um enorme estrondo e clareou. Todo mundo caiu no chão e ficou se debatendo. Senti uma moleza enorme e fiquei assim por uns 20 minutos, até o socorro aparecer. Só no dia seguinte descobri que uma pessoa tinha morrido. Graças a Deus não tive nenhuma sequela”, comenta Vecchio.
O motorista relata ainda que já ficou perto de outra descarga elétrica. “Trabalho na rua do Orfanato e estava no estacionamento com o meu chefe durante uma chuva há cerca de quatro anos. De repente um raio atingiu o para-raios do prédio, do nosso lado. Assustou, mas nada de grave aconteceu”, ressalta.
Apesar das experiências perigosas com raios, Vecchio garante que não tem medo. “Lógico que procuro ficar longe de locais abertos durante a chuva, mas não vivo assustado com qualquer barulho vindo do céu”, destaca.